Estrada Nacional 2 está na moda


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Ninguém duvida que o desporto dá saúde, mas eu nunca fui desportista para desgosto do meu pai que foi um grande atleta em várias modalidades ao longo da sua vida.

Eu andei de bicicleta em criança, mas fiquei apenas por aí. Só anos e anos depois, já ultrapassados os 40 recomecei a andar de bicicleta discretamente nos períodos de férias, percebendo que gostava realmente de passear de bicicleta. Não pela vertente desportista, mas exclusivamente pela turística.

De ano para ano as minhas viagens tornaram-se mais longas e de repente estava a viajar com a trouxa às costas e os passeios duravam dois ou três dias. Lentamente, as pessoas começaram a interessar-se pelas minhas viagens e pelas paisagens fantásticas que ia mostrando nas redes sociais e começaram a acompanhar as mesmas. Daí até associar causas solidárias a estes passeios foi um pequeno passo para mim, mas enorme salto para as instituições que tenho apoiado.

Sinto-me hoje muito honrado por ver que a Estrada Nacional 2 está na moda, porque em 2013 decidi fazer a minha primeira viagem longa, e como longa defini que tivesse mais de 500 quilómetros, sendo um dos primeiros a pedalar a mais longa estrada da Europa na sua totalidade. Com isso quis divulgar a beleza desta estrada, as suas paisagens, as suas gentes e as suas culturas.

Esta estrada tem uma extensão total de 739,260 quilómetros e foi inscrita no Plano Rodoviário Nacional a 11 de maio de 1945, curiosamente, dias após o final da 2ª Guerra Mundial na Europa. Esta inscrição transformou-a na coluna dorsal do interior do País, ligando o Norte ao Sul, de Chaves a Faro. No mundo apenas existem mais duas estradas com o mesmo tipo de perfil transversal, que são a Route 66 nos EUA e Ruta 40 na América do Sul.

Decidida a empreitada, optei por efetuar o percurso em 8 dias e com a bicicleta preparada e a ajuda de um amigo, cheguei a Chaves, cidade de uma beleza e história incomparáveis. As ruas estreitas com as suas varandas coloridas, a ponte romana e uma gastronomia de exceção foram o cenário ideal para começar. Eram 8 horas da manhã e estava eu de bicicleta pronta para começar a minha aventura, mas sem saber bem o que me esperava. Hoje sei que estava mal equipado em termos de bicicleta e vestuário, mas fui com o que tinha. E este primeiro dia foi difícil, mesmo muito difícil. Felizmente tive a companhia de alguns amigos neste primeiro dia, porque foram muitas horas a percorrer altos e baixos atravessando Vila Real e Santa Marta de Penaguião, mas lá cheguei a bom porto junto ao Douro para descansar as pernas e preparar-me psicologicamente para a grande subida do dia seguinte.

Quilómetros após quilómetros lá ia andando e as pernas a melhorarem um bocadinho. Infelizmente não me tinha preparado fisicamente antes do arranque e paguei bem caro esse erro na estrada. Nunca pensei em desistir porque sou muito teimoso nestas coisas. Se comecei, é para terminar, custe o que custar e doa o que doer.

A segunda etapa levou-me até Viseu com muito custo. O rabo assado do selim obrigou-me a medidas mais drásticas e a comprar creme de óxido de zinco, após ter percebido que em viagens longas será um artigo obrigatório. Também nesta etapa se partiu o porta bagagens e tive de encontrar quem soldasse o mesmo, mas o que aprendi mesmo é que estes percalços fazem parte das viagens em bicicleta e que esse espírito de aventura faz parte das viagens.

Na terceira etapa foi a chuva e um furo que me atrapalhou mais o dia, mas a partir do quarto dia já estava rodado, as pernas a ficarem no ponto e as etapas e os quilómetros a passarem cada vez mais facilmente. Este tipo de viagens tem a grande vantagem de limparmos a cabeça enquanto pensamos na vida. Não é fácil, mas muito gratificante e sem dar por isso já estava a descer para Faro, nesta ultima etapa também acompanhado de um amigo. 

Mas o melhor de toda esta viagem é o maravilhoso povo português e a sua espontaneidade. Desde a partida de Chaves que as pessoas metiam conversa, perguntavam o que andava por ali a fazer e quando dizia que andava a fazer a N2 toda para a divulgar como itinerário turístico agradeciam o meu esforço, ofereciam-me guarida e refeição, apesar de ter tudo marcado antecipadamente.

O momento mais curioso foi em pleno Alentejo quando um senhor que me encontrou em Brotas a descansar um pouco leu na minha camisola que ia até Faro e depois de confirmar isso mesmo apenas comentou: “Mas é maluco, ou quê?”.

Ao longo desta estrada, que vale a pena fazer na totalidade e de seguida, vamos vendo a diversidade deste nosso país magnifico. Vemos claramente Portugal a mudar. Percebemos o porquê do nome Trás-os-Montes, ficamos extasiados com as vinhas do Douro, aproveitamos as sombras agradáveis da zona de Viseu, refrescamos a alma e o corpo junto da barragem da Aguieira e percebemos a dimensão dos incêndios de Pedrogão devido à extensão das florestas e dos eucaliptais nas zonas de Góis, Pedrogão, Sertã e Abrantes. Mas o virar da página dá-se mesmo ao atravessar o Rio Tejo onde tudo muda. Param as montanhas, muda a vegetação, aparecem os famosos chaparros e as planícies são a perder de vista. A barragem de Montargil relaxa-nos antes de chegarmos ao Baixo Alentejo onde circulamos calmamente e em paz. Mas o Alentejo separa-se do Algarve para Serra do Caldeirão que atravessamos numa sequência frenética de curvas antes do ponto onde podemos avistar o mar desde o alto e observar a paisagem algarvia de uma só vez.

Mas para aproveitar bem esta paisagem, a gastronomia não pode faltar e a estrada abre-nos as portas de inúmeros restaurantes de muita categoria e mostra-nos os sabores de cada região de uma forma extraordinária. Em muitas das minhas viagens de bicicleta confesso que perco uns quilos de peso, mas na N2, pelo contrário encontrei alguns mais em cada região, mas foram verdadeiramente merecidos. Dos pasteis de Chaves ou das Miscaradas de Vila Pouca de Aguiar em Trás-os-Montes, às Tripas e ao vinho do Porto, aos cabritos e aos maranhos das Beiras, à Lampreia do Zêzere ou à Chanfana, às Migas com carne de porco no Alentejo ou ao cozido de grão de Almodôvar, sempre a pensar no arroz de lingueirão à chegada a Faro. E já nem falo dos doces que são outra perdição, indo das rabanadas aos doces de castanha, do bolo podre aos viriatos, da palha de Abrantes aos inúmeros doces conventuais, das queijadas aos doces de amêndoa e queijinhos de ovos algarvios que nos recebem em beleza. Depois precisamos de umas férias para ir desintoxicar e de tentar tirar o sorriso do rosto.

Esta estrada é uma viagem através de Portugal que vale a pena. Cheguei a Faro depois de 8 dias a pedalar, mas mesmo muito satisfeito. Recomendo a todos quer seja de automóvel, moto ou bicicleta que percorram estes quilómetros magníficos da N2 e ficar a conhecer este Portugal da melhor maneira possível.

 

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