Lisboa - Roma - Vaticano - Zero Desperdício


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Confesso que sempre me fez confusão ver comida em bom estado ser deitada para o lixo porque já ninguém a quer e quando tanta gente passa fome. Mas como quase todos, segui sempre o meu caminho e nada fiz. Mas um dia, um grande homem, de seu nome António Costa Pereira, que por acaso é meu primo, arregaçou as mangas e dedicou-se a esta causa nobre de lutar contra o desperdício alimentar.

Escreveu ao governo, aos deputados, ao Presidente da República, mas nada do que fazia interessava aos políticos mais focados naquilo que lhes poderia trazer votos. Nas empresas, a desculpa era sempre a mesma, atirando as culpas para as costas da ASAE. A primeira pessoa a responder-lhe foi o bispo Carlos Azevedo em nome do Patriarcado de Lisboa e que o recomendou para participar num programa Prós e Contras da RTP sobre a fome.

O António falou durante 30 minutos sem ser interrompido, deixando a plateia entusiasmada com o projeto. A partir daí tudo mudou e todos aqueles que lhe tinham virado as costas agora queriam aparecer ao seu lado na fotografia.

Curiosamente, a ASAE, que todos designavam como o mau da fita, disse de imediato que se poderia recuperar alimentos e que sempre tinha sido possível, desde que respeitadas as regras de higiene. A alteração de procedimentos e mentalidade foi felizmente rápida e tal como em tantas outras coisas, os portugueses adaptaram-se facilmente.

O meu primo António ligou-me e perguntou-me porque é que eu pedalava por tantas causas e não pedalava por ele, ao que de imediato respondi que em 2017 estaria ao lado dele a pedalar. Quando me disse que o maior apoiante da causa era o Papa Francisco comecei a desenhar a viagem que rapidamente se transformou na loucura de pedalar de Lisboa ao Vaticano, que por uma questão de datas disponíveis teria de ser feita em apenas 17 dias, o que daria pedalar 155 km diários em média. Muito acima do que já tinha feito.

Solicitei e consegui a audiência com Sua Santidade e comecei a preparar-me para esta travessia, mas rapidamente percebi que iria ser muito difícil, mas como sou uma pessoa de palavra, só havia uma possibilidade. Partir e chegar a bom porto.

E assim, dia 23 de maio, fiz-me à estrada na companhia de dois amigos que me acompanharam nos primeiros 5 dias e foi extenuante. Muito vento e temperaturas de 38 graus quase deitaram por terra esta aventura. Mas passados 6 dias, a temperatura baixou e o vento caiu permitindo recuperar o ritmo e a vontade de chegar a Roma.

Mas foi muito difícil. Tive dias difíceis como aqueles em que tive de fazer 190 km, os dois dias a subir os Pireneus, uma ponte que afinal não existia e me obrigou a voltar para trás e fazer um desvio de 30 km ou uma estrada que foi transformada em via rápida sem circulação de bicicletas e me levou para um desvio longo por um monte ao fim de 150 km.

Mas sem dúvida nenhuma que o pior foi a solidão quando fiquei sozinho. Foi muito difícil. E como chegava sempre muito tarde, tinha de lavar a roupa, carregar as baterias, jantar e descansar, não me restava muito tempo para tentar meter conversa com outras pessoas.

Felizmente que tive, principalmente em França a companhia do maravilhoso povo português que me acompanhou sempre, que paravam para tirar fotografias comigo, que me acompanhavam de bicicleta ou mesmo que me queriam dar boleia no seu camião.

E ao fim de 17 dias, entrei na Praça de S. Pedro e escusado será dizer que chorei naquele momento único. Emoção, descompressão, cansaço, não sei, mas foi um momento único.

E no dia seguinte, lá estava com o meu primo António numa audiência com Sua Santidade o Papa Francisco no Vaticano. Um homem simples que agradeceu o esforço que Portugal tem feito e o exemplo que temos dado ao mundo no âmbito do desperdício alimentar. E isso mesmo foi repetido mais tarde pelo Diretor Geral Adjunto da FAO (Food and Agricultural Organization – ONU) onde também fomos recebidos, tendo mesmo sido solicitado que a Associação fosse ensinar ao resto do mundo o que fazemos por cá. Um verdadeiro orgulho.

Por isso mesmo, só posso agradecer ao António Costa Pereira por tudo o que fez.

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