Uma presidência de esperança



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As recentes aprovações dos primeiros planos de recuperação e resiliência abrem o caminho para a operacionalização da tão aguardada bazuca europeia que permitirá apoiar os setores mais afetados pela crise pandémica e preparar as economias e as nossas sociedades para uma transição digital, verde e inclusiva, alicerçada na aposta na formação e qualificações.

A presidência portuguesa do Conselho da UE, que termina dentro de poucos dias, havia colocado como grande prioridade do seu programa de trabalho a ratificação da decisão sobre recursos próprios que permite à Comissão Europeia emitir, pela primeira vez, dívida conjunta (um eufemismo simpático para o nem sempre consensual termo do “eurobonds”) e assim financiar os diferentes planos de recuperação dos 27 estados-membros.

Desenganem-se aqueles que pensam que tal seria um exercício fácil, resumido a um mero formalismo. Quando a presidência portuguesa iniciou o seu mandato no início deste ano, muitas dúvidas persistiam sobre a as reais hipóteses de ver tal prioridade concretizada. Alguns estados-membros, nomeadamente a Polónia e Hungria, ameaçavam ainda bloquear a ratificação da decisão devido condicionalidade do estado de direito na utilização dos fundos. Outros países, mais a norte, davam sinais políticos preocupantes de querer adiar os seus processos internos devido à ameaça de um bloqueio húngaro e polaco. Foi graças ao forte empenho do governo português e da presidência que os piores cenários não se concretizaram, desbloqueando uma situação que ameaçaria toda a recuperação económica do continente e a própria credibilidade do projeto europeu. Após meses de intenso trabalho diplomático, os 27 Estados-membros acabaram por dar luz aos novos recursos próprios, o que permitiu à Comissão emitir a sua primeira dívida conjunta (com imenso sucesso) há algumas semanas. Esta quinta-feira foram aprovados os primeiros planos de recuperação, sendo um deles o de Portugal. Tudo, em menos de 6 meses.

Também o Certificado Digital Covid, aprovado em tempo recorde, permitirá harmonizar todos os procedimentos referentes às viagens dentro do território da UE já a partir de 1 de julho. Este será um elemento essencial para apoiar a recuperação do turismo, tão importante para muitos países da UE.

Mas a presidência portuguesa não se resumiu à questão da recuperação económica, bem pelo contrário. Para além de ter conseguido fechar quase todos os regulamentos necessários à execução dos próximos programas de financiamento dos fundos europeus (e aqui falamos de dezenas de diplomas legislativos), Portugal marcou a agenda europeia com a organização de uma Cimeira Social de sucesso, no Porto, no qual convergiram estados-membros, parceiros sociais e confederações empresariais, comprometendo-se com um ambicioso plano de ação que permitirá concretizar o Pilar Europeu dos Direitos Sociais. A UE não pode resumir-se a um mero mercado interno cujo objetivo se traduza apenas em taxas de crescimento ou oscilações de PIB. E é por saber que, nos dias de hoje, as questões do bem-estar não se resumem apenas a números ou estatísticas que Portugal colocou no centro da sua ação a questão social.  A economia tem de funcionar para todos. E para que tal aconteça a governação económica europeia tem de seguir um novo paradigma, integrando no seu seio as questões sociais. Só assim será possível garantir um desenvolvimento sustentável e inclusivo.  A Europa social, sonhada por Jacques Delores, tem de se traduzir em ações práticas que defendam o modelo social europeu e permitam combater a pobreza e as desigualdades. Ainda recentemente, foi aprovado um dos pilares desse plano de ação: a Garantia Europeia para Infância é agora uma realidade e permitirá retirar da pobreza 5 milhões de crianças nos próximos anos.

Para além da Cimeira Social do Porto, Portugal abriu uma nova fase nas relações com a Índia. A Cimeira UE-Índia permitiu lançar as bases para um futuro acordo comercial e de investimento que agorá será negociado entre a Comissão Europeia e as autoridades Indianas. Algo que muitos achavam impossível tendo em conta o contexto político atual.

Economia, Social, Investimento e Clima. Foi também com a presidência portuguesa que se chegou a um acordo para a implementação da ambiciosa e inovadora Lei Europeia do Clima que tem por objetivo tornar o bloco europeu no primeiro continente a atingir a neutralidade carbónica nos próximos 30 anos. As primeiras propostas legislativas que vão permitir concretizar este compromisso político já começaram a ser apresentadas pela Comissão Europeia e deverão ser fechadas até ao final do ano.

Finalmente, e após mais de um ano de bloqueio, a Conferência Sobre o Futuro da Europa avançou, tendo realizado a sua primeira reunião plenária, em Estrasburgo, este fim de semana, a 19 de junho. Esta é uma iniciativa única no quadro da democracia europeia. Pela primeira vez, os cidadãos estarão no centro do debate e poderão partilhar as suas ideias e propostas sobre a Europa com os mais variados responsáveis políticos nacionais e europeus no quadro dos Painéis dos Cidadãos que serão organizados em todos os países da UE. O processo de auscultação que agora se inicia durará até ao final do ano, estando o primeiro grande plenário conjunto, que contará com representantes dos cidadãos, marcado já para outubro. Esta é, tal como afirmou Guy Verhofstadt, co-presidente da Conferência, na sessão de inauguração do plenário, uma marca inequívoca do trabalho realizado pela presidência e do compromisso de Portugal para com o projeto europeu.

“Tempo de Agir!” Este foi o lema que norteou a presidência portuguesa nos últimos seis meses. O curto balanço aqui feito espelha o mérito de Portugal e um conjunto variado de importantes concretizações para o projeto europeu que nos devem orgulhar a todos enquanto Portugueses e enquanto Europeus. E se dúvidas houvesse sobre a importância das presidências rotativas do Conselho da UE, este pequeno artigo pretendeu dissipá-las.

Caberá agora à Eslovénia assegurar o leme da UE a partir de 1 de julho. Mas há quem comente em voz baixa e até com alguma amargura, o quão bom seria poder estender a presidência portuguesa por mais uns meses...

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André Costa
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