Humanos e animais: algumas notas



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          1. Na herdade da Torre Bela, 16 caçadores espanhóis abateram, em dois dias, 540 animais (veados, gamos e javalis). A matança foi bárbara. Levou demão ímpia e teve laivos de cobardia, pois a quinta é murada e os bichos não podiam fugir. Admite‑se a existência de crime, há inquéritos em curso.

           Aprendi a recusar juízos fáceis e primários, gosto de saber o que subjaz aos atos de pior conspecto. À medida que penso no caso, reforço o meu juízo: houve ali uma indesculpável chacina. A falta de empatia que esta denota também foi visível na ufana deposição feita no Facebook por uma responsável da Monteros de la Cabra, a empresa organizadora da montaria.

           Não se lance, no entanto, um anátema sobre a caça. Praticada com ética e critério, concorre para a boa gestão de recursos cinegéticos e para a manutenção da biodiversidade e dos ecossistemas. O caçador íntegro decerto tem vergonha do que sucedeu na Torre Bela.

            2. A tourada implica a dor de um animal senciente e a mostra de maus‑tratos. Cingindo‑me ao âmbito dos princípios, logo concluo que deve ser proscrita. Mas eu não sou a sociedade nem a represento no seu conjunto. A tourada é grata aos olhos e ao espírito de parte significativa dos Portugueses. Não sufrago, pois, que seja proibida de imediato ou a curto prazo. Prefiro a mudança de paradigma que acarrete a consciencialização de um forte desvalor e da qual resulte, um dia, o fim da tourada. Além disso, haverá mais ensejos de reconversão para os que o universo taurino alimenta se o dito epílogo decorrer de um processo e não de um corte abrupto.

            Quanto ao peso da tradição, relativizo‑o: o avanço civilizacional desproposita e torna indignos muitos usos do passado (por exemplo, os que têm fundo machista).

            3. Testemunho

            Em 2020, a Vanilla, uma cadela de raça golden retriever, entrou no meu mundo. Não vive comigo e, sempre que me revê e se abeira de mim — sempre, mesmo —, dá‑me as patas dianteiras e expressa indescritível alegria. Toda a vez que a Jūratė a passeia nas ruas adjacentes àquela onde moro, a Vanilla força o desvio no intuito de vir a minha casa. Bicho sortílego, devo‑lhe algumas das melhores impressões do ano que findou. Apraz‑me, em particular, percebê‑la feliz quando, oferecendo‑me o ventre, eu o acaricio e cocego. Se isto não é amor…

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Paulo Pego
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