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Sendo o Dubai conhecido a nível mundial, surgiu a ideia de pintar a ilha da Madeira com as cores do que outrora foi um deserto, agora densamente construído com a mais avançada tecnologia.
Com a recente contestação por parte dos madeirenses aquando da planificação e construção do gigantesco Savoy Palace, que se destaca desde a baía do Funchal pela sua dimensão extravagante e pelo seu estilo importado de alguma outra cidade da moda, pensei que existisse outro tipo de sensibilidade na construção futura, especialmente quando em grande escala e na cidade funchalense. Se calhar previa um cuidado maior na maneira como se olha a cidade, podendo, assim, projetar sem deturpar a história, a cultura e as raízes que definem o Funchal.
Estava enganada. Eu e tantos outros. Aproveitando a excentricidade já experimentada no Savoy, surge a ideia de fazer um novo empreendimento que ficará conhecido por Dubai na Madeira. O projeto promete ser “algo diferente”, que “desperte a atenção” e com uma “arquitetura inovadora”, nas palavras do investidor. O cliente-tipo que pretendem conquistar são clientes premium, estrangeiros, tendo como objetivo a obtenção de capital para a Madeira.
O poder da retórica é, de facto, algo incrível. Quantas pessoas conseguimos levar nos nossos desejos colocando-lhes o poder de fascinação e expectativa? É curioso quando as técnicas da retórica nos fazem pensar em que posição da vida queremos estar e o que consideramos essencial para o futuro. Parece-nos verdade uma declaração que é dita com um certo nível de clareza, que é desafiante e que, acima de tudo, promete cobrir a ilha com uma manta dourada de expectativa. Cruzo os dedos para que não seja poeira, também ela importada do Dubai!
Parece que nos falta identidade. Apesar de sermos conhecidos no Mundo pelas nossas paisagens de cortar a respiração, pelas nossas levadas desenhadas há centenas de anos que nos levam a conhecer lugares saturados de beleza, tons únicos de verde e azul que todo o madeirense pode orgulhar-se de presenciar diariamente, surge, agora, a vontade de “captar a atenção do exterior” para a “inovação”, corrompendo a nossa essência com intenções desajustadas. O problema é que esta visão está a ganhar terreno, (ou, literalmente falando, a corrompê-lo) embora o projeto se trate apenas de uma cópia do estilo que caracteriza outras cidades mais desenvolvidas.
Somos, de certa forma, drogados com um otimismo irrealista, baseado apenas num capitalismo que não tem adequação neste meio. Numa altura em que a consciência pela sustentabilidade e a ecologia estão a crescer, estes discursos estão ultrapassados. Funcionariam noutra cidade e não numa ilha que atrai por ser naturalmente bela, condição que é reconhecida pelos prémios internacionais que, anualmente, recebe.
Não é o madeirense que ficará feliz com esta dita “inovação”, desenhada, como mencionada, para investidores do exterior. Também não serão os turistas que, seduzidos pelo palavrão “Dubai”, cairão nesta falácia, visto que as razões que os fazem visitar a ilha são precisamente opostas a esta ideia.
Não sei bem o que nos falta. Se é de filosofia, para podermos evitar estas falácias, se o nosso problema é o excesso de capital para investir e, por isso, chovem investimentos milionários, ou se pecamos por uma falta de noção, não conseguindo valorizar o que é nosso e que é tão apreciado fora. Realmente não compreendo bem de onde vem tudo isto. Mas espero que nunca nos falte a consciência do lugar onde pertencemos, do lugar que, quando vamos embora, queremos voltar, e do lugar onde tentamos, por vezes, encontrar noutros lugares, para onde partimos.