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Por que é que a Rússia decidiu invadir a Ucrânia em 24 de fevereiro de 2022? A resposta a essa pergunta varia de acordo com quem a responde.
A Ucrânia tem estado no centro das divergências entre a Rússia e o Ocidente praticamente desde que declarou a independência em relação a Moscovo, em 1991, após ter integrado a União Soviética. Em 2014, a situação agravou-se depois da Rússia anexar a península da Crimeia. Desde então, a escalada de tensão aumentou. Até à invasão em grande escala, em 2022, destacam-se alguns momentos cruciais para perceber o conflito entre os dois países.
Vamos ver, então, para perceber melhor a desgraça que está a acontecer à Europa. Em 2004, o candidato pró-Rússia Viktor Yanukovich é declarado Presidente, mas uma alegada fraude eleitoral provoca um protesto, conhecido como a “Revolução Laranja”, e força a nova votação, que resulta na eleição do pró-ocidental Viktor Yushchenko.
Yushchenko promete tirar a Ucrânia da órbita de Moscovo, em direção à Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO) e à União Europeia (UE).
Na cimeira de Bucareste, em 2008, a NATO concorda com a adesão da Ucrânia. No entanto, dois anos depois, Viktor Yanukovich é eleito chefe de Estado e, uma semana antes da assinatura do acordo com a UE, suspende o processo e anuncia que a Ucrânia prefere juntar-se à Rússia na União Aduaneira Eurasiática.
A decisão gera uma onda de protestos violentos de apoiantes da integração europeia. — o “Euromaidan” —, centrados na Praça Maidan, em Kiev.
Em fevereiro de 2014, Yanukovich foge do país quando enfrentava um processo de destituição e refugia~se na Rússia. No mês seguinte, a Rússia anexa a península da Crimeia, no sudeste da Ucrânia.
Em abril, separatistas com apoio de Moscovo declaram a independência das repúblicas de Lugansk e de Donetsk, na região oriental ucraniana do Donbass, iniciando uma guerra que provoca 14 mil mortos em oito anos.
Em maio, o empresário Petro Poroshenko ganha as eleições presidenciais com uma agenda pró-ocidental. Menos de um mês depois, os líderes da Ucrânia, Rússia, França e Alemanha criam uma plataforma de diálogo para tentar resolver a guerra no Donbass, conhecida por Formato Normandia. Estão aqui os culpados.
2015: ACORDOS DE MINSK
Em 2015, depois de longas conversações, é em Minsk, capital da Bielorrússia, que se chega a acordo para pôr fim à guerra. Sob mediação franco-alemã, é assinado um plano de paz entre Rússia e Ucrânia, subscrito pelas Repúblicas Populares de Donetsk e de Lugansk. O acordo impunha cessar-fogo imediato, mas a paz nunca foi alcançada e traduz-se em catorze mil mortos.
Em 2016-2017, a Ucrânia atribui à Rússia a autoria de vários ataques informáticos à rede elétrica que causa um apagão geral e acusa Moscovo de uma “guerra cibernética”. As instituições ucranianas sofreram 6,5 mil ataques nos dois últimos meses de 2016.
Em 2019, o actor Volodymyr Zelensky vence as presidenciais na Ucrânia e promete acabar com o conflito no leste do país, com a ajuda do Presidente francês Emmanuel Macron e da chanceler alemã Angela Merkel.
No ano seguinte, o Presidente russo vence o referendo que o autoriza a ficar no poder até 2036, com cerca de 73% dos eleitores. O Presidente russo exige que o país vizinho não se torne membro da NATO.
A 21 de fevereiro deste ano, Putin acusa a Ucrânia de pretender usar armas nucleares para atacar a Rússia. Num longo discurso, defende que a ideia da Ucrânia se juntar à NATO é “uma ameaça direta à segurança da Rússia” e reconhece a independência das regiões separatistas pró-Rússia do leste da Ucrânia.
A 24 de fevereiro, Putin anuncia o lançamento de uma operação militar especial na Ucrânia com o objetivo de desmilitarizar o país. O Presidente russo acusa os EUA e os seus aliados de ignorarem a exigência de Moscovo para que a Ucrânia nunca integre a NATO (cf. /www.poder360.com.br/europa-em-guerra/donetsk-e-lugansk-um-braco-estendido-da-russia-dw/).
As zonas da região do Donbass se separaram da Ucrânia em 2014 e que Vladimir Putin viabiliza através de ajuda militar, auxílio financeiro e com vacinas contra a covid-19, transforma-as em estados satélites da Federação Russa. Aqui vivem cerca de três milhões de pessoas. Cerca de 800 mil dos seus habitantes têm passaporte russo.
OS DADOS DA QUESTÃO
- Argumentos da Rússia e condições para encerrar o conflito
A Rússia vem reforçando seu controlo militar em torno da Ucrânia desde o ano passado, acumulando dezenas de milhares de tropas, equipamentos e artilharia às portas do país.
Em dezembro de 2021, Putin apresentou à Otan – Organização do Tratado do Atlântico Norte, – uma lista de exigências de segurança. A principal delas era a garantia de que a Ucrânia nunca entrasse na Otan e que a aliança reduzisse sua presença militar na Europa Oriental e Central.
As negociações não avançaram, e o reforço militar nas fronteiras não arrefeceu, apesar do esforço diplomático empreendido no começo de 2022.
Dias antes de iniciar a invasão, Vladimir Putin reconheceu a independência de duas áreas separatistas pró-Rússia da Ucrânia, autodenominadas República Popular de Donetsk e República Popular de Lugansk.
No dia da invasão, Putin afirmou haver um “genocídio” em curso no leste ucraniano, promovido por tropas “neonazis” do país contra russos étnicos e separatistas da região.
A Rússia pede que a Ucrânia se comprometa com uma neutralidade militar – o que impediria o país de se juntar à Otan. Um dos modelos apresentados é o da Suécia ou da Áustria, que não integram a aliança e não fazem parte de acções militares.
Além disso, o Kremlin exige a desmilitarização e "desnazificação" da Ucrânia, o reconhecimento da independência de Donetsk e Luhansk, bem como o entendimento de que a Crimeia faz parte do território russo desde 2014, quando a península foi anexada no primeiro movimento militar de Putin na região.
- Os argumentos da Ucrânia. Este país recebeu uma grande onda de apoio internacional de países tanto no âmbito militar — com diversas nações ocidentais enviando armamentos, drones, sistemas de defesa contra ciberataques e outros — quanto no repúdio de instituições globais e de grande parte do sector privado aos ataques.
Uma figura de destaque emergente da situação de guerra foi o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, que passou a pressionar as nações ocidentais pelo apoio militar e humanitário e, também, a tentar negociar a entrada do país na União Europeia e até na Otan — embora Zelensky já tenha abdicado desta condição.
Zelensky, de família judia, classificou como "risíveis" as alegações de que a Ucrânia estaria tomada por "neonazis" e disse que, se as negociações com a Rússia continuassem a falhar, o mundo poderia testemunhar o acontecimento de uma terceira Guerra Mundial.
Ao longo da guerra, as autoridades ucranianas estabeleceram como prioridades a imposição de sanções devastadoras à economia russa, bem como o isolamento de Putin no cenário internacional.
- Os impactos na economia Russa. As primeiras sanções contra a Rússia foram anunciadas horas depois do início da guerra, como sendo as maiores sanções económicas já impostas a um país.
Activos de bancos russos foram congelados em diversos países, bem como os activos de oligarcas russos e pessoas ligadas ao governo de Vladimir Putin. O rublo atingiu o mínimo valor recorde e o Banco Central russo suspendeu, durante vários dias, as negociações na Bolsa de Valores de Moscou.
Um dos mais duros golpes foi a exclusão de bancos russos do sistema global de pagamentos Swift, isolando ainda mais a Rússia do ambiente de negócios internacional.
A certificação do gasoduto Nord Stream 2 — um megaprojeto de 11 biliões de dólares, com 1.200 quilómetros, concluído em setembro de 2021 — foi suspensa pela Alemanha.
A economia russa sentiu debandada do setor privado, indo de petrolíferas ExxolMobil e Shell até empresas do ramo alimentar, como McDonalds, e do entretenimento, como Netflix e Spotify.
- As consequências económicas globais da guerra. A invasão russa gerou uma reação em cadeia globalmente. Os preços do petróleo subiram acima de 110 dólares por barril, atingindo um recorde dos últimos oito anos, à medida que aumentava a preocupação de que o crescente isolamento económico da Rússia desde a invasão da Ucrânia interromperia o fornecimento global de energia.
O risco de aumento da inflação e baixo crescimento económico causa receio nos sectores monetários em todo o mundo, apesar da situação da Europa ser a mais delicada. Espera-se que o consumo privado, o investimento e as exportações cresçam a um ritmo mais lento em todo o continente.
- O líder russo conta com o apoio de alguns aliados que dependem ou precisam da ajuda da Rússia. A Bielorrúsia tem uma posição estratégica muito importante no Leste Europeu, pois faz fronteira tanto com a Rússia e com a Ucrânia. Por esta razão, também foi alvo de sanções de outras nações.
O presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, foi incisivo ao declarar apoio aos movimentos de Putin na Ucrânia, tem “certeza de que a Rússia sairá dessa batalha unida e vitoriosa” e declarou “todo o apoio ao presidente Putin e seu povo”.
Daniel Ortega, presidente da Nicarágua, disse que Putin estava certo ao reconhecer duas regiões separatistas do leste da Ucrânia como independentes.
Cuba defendeu uma solução diplomática para o conflito na Ucrânia, mas criticou os EUA pela “a expansão progressiva da Otan em direção às fronteiras da Federação Russa” e foi subscrito pelo presidente do Irã, Ebrahim Raisi.
Outro apoio veio da Síria, porque a Rússia ajudou numa guerra civil em favor do presidente Bashar al-Assad. Além das nações citadas, a Índia, ao lado da China e dos Emirados Árabes Unidos, decidiu se abster de votar a favor de resoluções contra a Rússia perante o Conselho de Segurança.
- O papel da China
A China, liderada por Xi Jinping, coloca-se repetidamente a favor do diálogo e da manutenção da paz. “É imperativo que todas as partes exerçam contenção e esfriem a tensão, em vez de acrescentar combustível ao fogo; é importante pressionar por uma solução diplomática, em vez de agravar mais a situação”, disse o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, Zhao Lijian.
- A crise dos refugiados
Na manhã dos ataques, filas de carros de civis deixam Kiev; era o começo da fuga que envolveu mais de 6,5 milhões de pessoas deslocadas dentro do país. Além disso, mais de 3,5 milhões já deixaram a Ucrânia para países vizinhos — a maior crise migratória desde a Segunda Guerra Mundial.
Apesar de a Rússia negar alvo instalações civis, bombardeamentos incessantes em cidades como Mariupol, incluem escolas, orfanatos, edifícios residenciais, hospitais e teatros.
- Guerra de comunicação. Putin afirma que está a lutar contra uma guerra de informação com o Ocidente sobre o conflito na Ucrânia, e, por isso, aprovou uma lei que impõe penas de prisão a meios de comunicação ou pessoas que promovam "desinformação" a respeito da "operação militar especial" na Ucrânia.
O governo da Rússia bloqueou o acesso ao Facebook, em todo o país e o Twitter foi bloqueado no território russo. Outros serviços de informação de países do Ocidente estão bloqueados, como os canais de notícias britânico BBC e alemão Deutsche Welle. Além disso, Wikipédia também foi bloqueada.
A União Europeia também decidiu retaliar veículos estatais russos em seu território, e suspendeu a licença da TV Russia Today, por exemplo.
- Riscos nucleares
A disputa pelo controlo de centrais nucleares na Ucrânia e o anúncio de Putin em colocar em alerta as forças nucleares russas acenderam um sinal de preocupação na comunidade internacional.
Um dos momentos de maior tensão foi um ataque à central nuclear de Zaporizhzhia, a maior em toda a Europa, que provocou um incêndio ao lado do reactor principal.
António Costa Guimarães