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O título faz-nos lembrar uma luta entre alguém vs. algo – e é disso mesmo que se trata, ainda, a relação entre mulheres e política. Uma luta constante, em que temos de provar que o nosso potencial é dez vezes superior ao do nosso oponente, caso este tenha sido abençoado no seu nascimento pela, ainda vista como qualidade, de ser um homem!
Ainda nos meus primeiros anos de estudante universitária, quando os sonhos falavam mais alto que a realidade, lembro-me de numa conversa informal comentar que diplomacia era onde mais gostaria de trabalhar dali a uns anos. Pasmem-se – ou não – mas a resposta que ouvi do outro lado foi “e então, já começaste a fazer uma pesquisa do potencial candidato que te pode levar até aí?”. Não me foi mencionado o quão árduo será chegar a tal posto, quanto teria de estudar, do quanto teria de abdicar, porem não tardaram a lembrar-me que sexo seria a via para atingir aquele que, na altura, era o sonho.
Entenda-se, no entanto, que o problema é histórico. A política sempre foi vista como um passatempo dos homens enquanto que as mulheres, à exceção de alguma figuras históricas, raramente foram vistas como peças fundamentais e de destaque, mas como piões num jogo de manobras operadas por homens. Felizmente, não podemos dizer que nos dias que correm enfrentamos o mesmo nível de patriarquismo desenfreado. Se compararmos entre Janeiro de 2014 com o referente ao ano de 2017, o ranking publicado pelas Nações Unidas em relação a mulheres em cargos parlamentares mostra que Portugal passou de uma percentagem de 21,4% para 34,8% - e isto é uma vitória apesar do seu sabor agridoce. O mesmo ranking mostra países como Moçambique, Angola, Ruanda, Tanzânia, Timor, entre outros, bem acima de Portugal. A não menção de país europeus é intencional – pois numa discussão de café, se usarmos o exemplo da Suécia, Finlândia ou Bélgica, ser-nos-á dito, “mas esses são mais desenvolvidos” – então, que dizem vocês de levarmos dez a zero de ex-colónias? A sociedade portuguesa ainda é muito tradicional no que respeita aos papéis familiares, mas também o são estes países (em alguns casos este traço é ainda mais acentuado) logo, qual é a justificação?
Temos quatro décadas de democracia, 31 mulheres ministras. Quantos homens? 467 ministros. 41 anos, 25 governos e 15 chefes de governo que resulta em 1609 homens nomeados para funções governativas que se contrapõe a 127 mulheres. Depois de Maria de Lourdes Pintasilgo ter ocupado a pasta dos Assuntos Sociais como ministra no II e III Governos Provisórios (entre Setembro de 1974 e Março de 1975) e ter sido indigitada por Ramalho Eanes como primeira-ministra no V Governo Constitucional em 1979, as mulheres que participaram no Executivo português ocuparam apenas cargos de secretárias ou subsecretárias de Estado – 30 nomeações em 12 governos
A tendência é a mudança, a evolução, a aceitação.Pedro Passos Coelho foi, até então, o primeiro-ministro que, pela primeira vez, indigitou mulheres para pastas que sempre foram território masculino: Anabela Rodrigues, que assumiu a pasta da Administração Interna após a demissão de Miguel Macedo, e Berta Cabral que foi nomeada secretária de Estado da Defesa, bem como outras três pastas tradicionalmente masculinas — Finanças, Agricultura e Justiça — estastambém exercidas por mulheres ministras: Maria Luís Albuquerque, Assunção Cristas e Paula Teixeira da Cruz. No entanto o record pertence a José Sócrates, que nomeou 5 mulheres em simultâneo para chefiar ministérios, no seu segundo mandato.
Porém, o típico ministro português continua a serhomem, a meio da década dos 40, nascido em famílias urbanas da classe média, altamente escolarizado e com um passado de trabalho em funções públicas, apesar de Portugal ter uma das taxas mais altas da Europa de mulheres trabalhadoras desde meados da década de 60. O chauvinismo ainda é cultura entre nós, seja através de piadas que têm um manto de malícia que parece invisível aos olhos de muitos, seja porque listar uma mulher para uma qualquer função fere egos se ela estiver um lugar acima do senhor que se acha superior, mais competente e mais valioso, apesar de nada ter provado a esse respeito.
É hora de percebermos que o lugar da mulher é onde ela quiser, que não se trata de banir relações no ambiente de trabalho ou piadas saloias em que todos nos rimos à primeira, mas já cansam de tanta repetibilidade – trata-se sim de aprender o significado de uma simples palavra que muitos aparentam esquecer: respeito!
Continua a não fazer sentido haver um Dia da Mulher, quando estes problemas não são apenas criados por uma sociedade preconceituosa e pelo patriarquismo inveterado, mas também pelas próprias mulheres, que continuam a abdicar dos seus lugares em prol de outros, simplesmente porque o sacrifício não parece compensar a curto prazo – e a isto chama-se o egoísmo: ao entregarmo-nos ao comodismo aceitamos o lugar que os outros acham que merecemos e, quando este passa a tendência, não afetamos só as nossas vidas, mas ditamos infinitas sentenças através da passividade que se vai enraizando de mansinho. A dificuldade não pode nunca ser a razão de desistirmos, ou corremos o risco de dar razão a quem nos questiona e põe em constante dúvida as nossas capacidades.
As ideias têm consequências, tal como os comportamentos e enquanto não percebermos o significado e o impacto que as posições que tomamos na vida têm no mundo que nos rodeia, jamais faremos parte de um país onde a igualdade é para todos e o nde a equidade não passa apenas de uma utopia, onde os sonhos deixam de ser obtidos por saias curtas e passam a ser concretizados pelo poder das nossas mentes.