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O dia estava cinzento e pesado contrastando com a leveza e a luz com que agosto invadiu ilha. A brisa, que me tocava ao de leve, sussurrava-me ao ouvido que o verão estava a despedir-se e o outono, timidamente, a entrar em cena, em bicos dos pés.
No alto da minha varanda, enquanto espero que S.Sebastião me salve desta lassidão, lembro-me que nunca me agradou o mês de setembro. É morno. Não tem tempero.
Ainda se sente o verão e as férias, mas ainda assim o tempo arrefeceu. Quase que parece um mês que sofre com falta de personalidade. Mas na verdade setembro obriga a recomeços. Sinto logo que estou a entrar noutro ciclo, numa espécie de advento interior. Projeto-me, em silêncio, para um ano que já vai adiantado e que daqui a nada termina.
Quando me deparei com estes pensamentos, decorrentes do meu tédio existencial, lembrei-me da pergunta que a Inês Meneses da Silva faz aos seus convidados no programa de rádio ‘Fala com Ela’ – que tanto me tem acompanhado – sobre o que é para eles um dia bom.
O meu coração, de repente, transborda e eu percebo que estás na ponta da língua sobre o que é ter um dia bom. É simplesmente escolhermos entre um dos nossos três ou quatro restaurantes preferidos, que estão escritos com tinta transparente na nossa íntima listinha que tresanda a rotina de apaixonados.
Um dia bom é ficarmos tardes a comer, a beber e sobretudo à conversa, sem pressas, sem julgamentos. Sem mundo além de nós os dois e aquelas palavras.
Dou por mim a pensar no meio do meu labirinto interior que não há nada mais bonito no mundo do que uma conversa. Quando conversamos com verdade despimos os véus. Abrimos. Ouvimos. Damos e recebemos.
Às vezes pergunto-me se a vida cabe toda numa conversa. Ou se a conversa cabe toda na vida. Conto pelos dedos a quantidade de pessoas que gosta de conversar assim. De peito aberto. Com o olhar. Com o silêncio. De corpo inteiro.
E em fins de semana lassos ali ficamos nós. Abandonados numa mesa de um restaurante que já faz parte da jóia da nossa rotina, seja na costa norte ou sul da ilha, e podemos ir tão longe, num espaço tão exíguo, e esquecer o peso e dor de existir. Consigo até distrair-me da finitude da vida.
Depois de viajar sobre tudo isto, numa quarta-feira aleatória, volto à terra e lembro-me que tenho uma crónica por escrever, primeira por sinal. Dizem que não se esquecem.