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Era uma vez uma cigarra que vivia despreocupada, cantando e saltitando pelo bosque. Era verão, nada lhe faltava! Se tinha fome, era só pegar numa erva e meter à boca! Se aos parceiros de geringonça fosse preciso agradar, era só ceder em uma ou duas promessas-bandeira e tudo estava resolvido! Ainda por cima, com os juros da dívida historicamente baixos, como não aproveitar? Afinal de contas, há mais vida para além do défice!
Certo dia, a cigarra encontrou uma formiguinha carregando uma pesada folha. Perguntou a cigarra à formiga:
- Porquê tamanho esforço quando há tanta comida disponível? Porque não gozas o verão?
A formiguinha, cautelosa, respondeu que no verão se prepara o inverno. No verão, arruma-se a casa, e usa-se a abundância de recursos disponíveis para se pensar a longo prazo. No verão, abate-se dívida e fazem-se as reformas estruturais necessárias. No verão, fazem-se coisas menos fáceis de vender aos eleitores e que porventura acarretam custos (também políticos) avultados, mas que ajudarão a melhor aguentar o inverno.
A cigarra não ligou. A formiga ainda a avisou que passaria frio e fome se não mudasse de vida, mas a cigarra só queria mesmo era cantar, dançar, saltar, viver feliz! Para quê construir um abrigo quente quando o sol bate de frente? Mais uns milhões para a TAP, mais uns milhares de funcionários públicos, mais umas gorduras para um gordo Estado... Amanhã podemos já cá nem estar, porque não então desfrutar?
Até que enfim chegou o inverno. No início, o consenso era que tudo seria passageiro. A pandemia mais uns meses estava resolvida, a inflação era transitória, a Rússia não tinha recursos nem aliados para sustentar uma guerra de longa duração. Era apenas uma brisa fresquinha. Claro que, no país das cigarras otimistas, este foi um pensamento bem acolhido. Só que a pandemia durou, a guerra ainda dura, e a inflação sufoca e sufocará. A cigarra da vidairada, com o tempo, foi ficando fria, gelada, cada vez mais esfomeada. Até a bazuca parece curta para cobrir o caos na habitação, o caos na saúde, o caos nos comboios, o caos na educação, o caos na justiça, o caos na energia, o caos na defesa, o caos da inflação, o caos...
Desesperada, a cigarra bateu à porta das formigas. Na fábula de Esopo, as formigas, vendo a cigarra em tão mau estado, acolheram-na, agasalharam-na, e alimentaram-na. Contudo, porque no mundo das formigas todas trabalham para sobreviver ao futuro, a cigarra não podia ser exceção. Por isso, na fábula de Esopo, as formigas exigiram à cigarra a sua quota-parte de esforço. Sortuda da cigarra que a contrapartida foi fazer aquilo que ela mais gosta: animar as formigas, tocando e cantando as suas melodias!
Infelizmente, o mundo do formigueiro europeu é menos cor-de-rosa. Também há algumas formigas, mas nem os mantimentos acumulados eram tão numerosos assim, nem a solidariedade será tão forte, nem as contrapartidas são tão prazerosas. A Europa, em decadência há décadas, vê-se de repente em confronto com um desafio gigantesco que exige uma resposta à altura. Então, para sermos acolhidos no umbrela europeu, não teremos outra opção senão ceder a duras exigências: reforçar despesa em setores onde até agora estávamos quase ausentes (sobretudo a defesa) e, essencialmente, apertar o cinto. E de pouco adianta reclamar da subida das taxas de juro, de pouco adiantam greves e protestos por mais nobres que sejam as causas (geralmente são). No país das cigarras, nem há dinheiro nem há engenho para o fazer render. E já se sabe, casa onde não há pão…
… todos ralham mas alguém tem razão! Como qualquer conto infantil, também este conto onde todos estamos imersos encerra uma lição moral. A moral desta história é: Se votas na cigarra, não esperes pensamento de formiga. Se votas PS, espera invernos de stress. Quem promete verões de folia só tem para dar invernos de agonia. Para os que duvidavam e ainda precisavam de evidências, eis o teste do algodão. Que nos sirva de lição.
Vitória, vitória, ainda não se acabou a história.