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Aqui segue o meu depoimento de um exilado no estrangeiro que assim “viu” a Guerra Colonial:
O elemento central e determinante que fez eclodir a Guerra Colonial foi o discurso do Presidente francês General De Gaulle a 26 de Agosto de 1958 em Brazaville em que declarou "Quem quiser a independência que a assume, a metrópole não fará oposição". Brazaville é a capital do Congo então francês, na margem do rio Congo mesmo em frente a Leopoldville, hoje Kinshasa, e a pouco mais de cem quilómetros da fronteira Norte de Angola, a escolha desta cidade africana não foi inocente. Essas palavras caíram como uma bomba sobretudo nos governos europeus que tinham colónias em África.
Em Portugal esse discurso foi completamente censurado, nenhum media, português a difundiu, não existem documentos em Portugal sobre isso. Por essa razão praticamente todos os historiadores portugueses a desconhecem, é preciso ir à imprensa estrangeira e mais recentemente ir ao Google ou Wikipedia onde facilmente se encontra. Em Bruxelas, onde decorria a Exposição Universal de 1958 com a visita de muitos estadistas e dirigentes de primeiro plano perante a declaração de DeGaule o governo belga reuniu de imediato durante três dias sob grande tensão para debater e definir uma posição credível a nível internacional saíram com a declaração que o objectivo da colonização era o de levar a colónia à independência. Começaram as negociações para a independência do Congo Belga que culminam com a independência a 30 de Junho de 1960.
Muitos angolanos que lá trabalhavam assistem aos comícios e discursos da campanha eleitoral e voltam para Angola e difundem o que ouviram nos comícios. O entusiasmo e expectativa foi muito grande sobretudo no Norte de Angola, donde eram oriundos a maioria destes trabalhadores emigrantes. Em Janeiro de 1961 um grupo de representantes de aldeias essencialmente do Norte de Angola pede audiência ao Governador da colónia para se informar da posição do Governo Português sobre os recentes acontecimentos em África e que projectos tinha para Angola. A surpresa do Governador é total e este resolve consultar Lisboa. Depois de um telefonema que durou várias horas, o Governador manda os representantes indígenas subirem para um camião que os conduziram a um descampado onde são abatidos a tiro. O que os governantes portugueses ignoravam é que esses representantes indígenas tinham amigos no Congo, onde alguns eram conhecidos de membros do Governo Congolês que tinha sido formado havia seis meses. Na imprensa internacional são publicadas fotografias de soldados portugueses exibindo as cabeças cortadas dos indígenas e a jogarem futebol com elas.
Nos dias seguintes, aviões T6 da Força Aérea Portuguesa baseados na colónia vão metralhar povoações indígenas no Norte de Angola. É claro que isso não é mencionado na imprensa portuguesa, apenas uma excepção, a revista "Mais Alto" órgão da Força Aérea, menciona pela mão de Francisco Pinto Balsemão, na época completamente desconhecido e a prestar serviço militar na colónia, menciona que "as asas da cruz de Cristo castigaram severamente a traição", mas um leigo não sabe que se tratava. É na mesma altura que surgem as greves na Cotonang e a repressão que se seguiu. Foi na sequência destes acontecimentos que se levantaram populações indígenas do Norte de Angola contra os colonos portugueses ali estabelecidos aos gritos de "Portugal fora de África", mas também o ataque de elementos do MPLA contra quartéis portugueses em Luanda para procurar armas para combater a presença portuguesa. Salazar responde com “Para Angola rapidamente e em força” e “Estamos lá há quatrocentos anos, o que é nosso, ninguém nos tira”. O descrédito internacional de Portugal é total e a Índia aproveita para tomar posse das colónias em Goa, Damão e Diu, os protestos de Portugal são completamente ignorados internacionalmente quando não nos riam na cara. Delegados do Governo português são expulsos de organizações internacionais onde chovem moções de censura e apelos a sanções.
A ligação da Guerra Colonial ao fim do regime fascista foi claramente exposta pela primeira vez em 1964 pelo dirigente comunista Alvaro Cunhal na sua obra "Rumo à Vitoria". E é absolutamente indiscutível que foi a Guerra Colonial que a 25 de Abril de 1974 fez derrubar o regime fascista instaurado pelo golpe militar de 1928. Segue um exemplo da actividade de elementos da oposição refugiados em França que difundam na rádio francesa musicas e canções de protesto pelo que se passava em Angola. ((ass. Gustavo Medeiros).).