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Comemora-se no corrente ano (2016) o sexagésimo oitavo aniversário da aprovação da Declaração Universal dos Direitos do Homem (10 de Dezembro de 1948), pela Assembleia Geral das Nações Unidas. É uma efeméride que não se pode deixar passar em branco, sob pena de não estarmos a contribuir para uma sociedade mais justa, mais tolerante, mais solidária, sempre em desenvolvimento, progresso, ordem, e paz, tentando por esta forma sensibilizar todos aqueles que analisarem e, na medida do possível, observarem, na prática, este tema.
O nosso contributo, com o valioso apoio de alguns órgãos de comunicação social, vai consistir na publicação de cerca de 15 artigos relacionados com a articulação dos Direitos Humanos, e outras dimensões das modernas sociedades: cidadania, emigração, multiculturalismo, educação, justiça, valores culturais, entre outros, com sustentação científica de vários autores nacionais e internacionais, que surgirão ao longo dos textos a produzir.
Da interdependência estruturada dos Direitos Subjectivos/Naturais e os Direitos Positivos, no ordenamento jurídico das sociedades modernas, resulta, necessariamente, a observância, total ou parcial dos Direitos Humanos: «A ideia de direitos do homem e a ideia da soberania popular, vieram determinar a autocompreensão normativa dos estados democráticos de direito até hoje.» (HABERMAS,1998:160).
Como já foi inferido noutros contextos, temos verificado, principalmente a nível da União Europeia, que uma das condições de candidatura de qualquer país a esta organização é, precisamente, o estabelecimento de uma democracia plena, onde os direitos humanos sejam observados sem receio, embora o direito positivo seja um direito fundado nas decisões alternadas de um legislador político, que ele cada vez cubra menos as necessidades da legitimação, recorrendo à tradição ou à eticidade, nas quais nos formam ao longo da vida, de resto, o direito natural clássico, desde a tradição Aristotélica e do direito natural cristão, entraram pelo século XIX, em cujo período se refletia um “Ethos Social Global”, que penetra através das distintas capas sociais da população e vincula, mutuamente, as diversas ordens sociais. (cf. HABERMAS, 1998:160).
Não sendo, todavia, os direitos do homem e o princípio de soberania popular, as únicas ideias para justificar o direito moderno, encontraremos, certamente, outras dimensões que se tornam relevantes no processo de contribuição de uma sociedade plural e que têm a ver com a autodeterminação e autorealização porque: com efeito, entre os direitos do homem e a soberania popular, por um lado; e as duas dimensões, por outro, não pode, seguramente, estabelecer-se uma correspondência linear.
Entre ambos os conceitos dão-se afinidades que podem acentuar-se, com mais ou menos força. Às tradições políticas atuais nos Estados Unidos, chama HABERMAS: «liberais e republicanos e entendem por um lado os direitos do homem como expressão de autodeterminação moral, por outro lado, a soberania popular como expressão da autorrealização ética». (1998:164).
O sistema de direitos constituído, e que conduzirá, afinal, a uma melhor compreensão, aceitação e cumprimento dos direitos humanos, tem de equilibrar-se na autonomia privada e na autonomia pública dos cidadãos e tal «sistema há-de conter, precisamente aqueles direitos que os cidadãos hão-de outorgar-se reciprocamente e regular a sua convivência em termos legítimos com os meios do direito positivo.» (Ibid.:184). E é interessante verificar a importância que os direitos subjetivos ou naturais têm nos ordenamentos jurídicos modernos.
O sistema de direitos assim defendido, há-de conter, exactamente, os direitos que os cidadãos têm que se atribuir e reconhecer-se, mutuamente, se quiserem regular, legitimamente, a sua convivência com os meios do direito positivo, isto é, com o direito escrito: «O significado das expressões: “direito positivo” e “regulação legítima” fica claro e com o conceito de forma jurídica, a qual estabiliza expectativas sociais de comportamento de modo indicado, e o princípio do discurso, a cuja luz se pode examinar a legitimidade das normas de acção.» (Ibid.:188).
Teremos, então, três categorias de direitos que integram o código que é o direito de poder, isto é, o status das pessoas jurídicas: «a) Direitos fundamentais que resultam do desenvolvimento e configuração politicamente autónomos do direito no maior grau possível de ajudar liberdades subjectivas de acção; b) Direitos fundamentais que resultam do desenvolvimento e configuração politicamente autónomos do status do membro da associação voluntária que é a comunidade jurídica; c) Direitos fundamentais que resultam directamente da accionabilidade dos direitos, ou seja, da possibilidade de reclamar juridicamente o seu cumprimento e do desenvolvimento e configuração politicamente autónomos da protecção dos direitos individuais». (Ibid.:188).
É a partir daqueles direitos fundamentais: iguais liberdades subjetivas de ação; status da comunidade jurídica e proteção dos direitos individuais, que vamos encontrar os direitos fundamentais a participarem, com igualdade de oportunidade, em processos de formação da opinião pública e na vontade comum dos cidadãos, em exercerem a sua autonomia política e mediante os que estabelecem direito legítimo.
Os direitos políticos fundam o status de cidadãos livres e iguais, que constituem autoreferência, possibilitando aos cidadãos mudar a sua posição jurídica material; com a finalidade de interpretar, desenvolver e configurar, mediante a troca da sua autonomia privada e sua autonomia pública.
Os direitos fundamentais que garantissem condições de vida que estejam social, técnica e ecologicamente asseguradas, na medida em que isso seja necessário, em cada caso, para um gozo em termos de igualdade de oportunidades dos direitos civis, automencionados.
Por outro lado, a Declaração Universal dos Direitos do Homem, (DUDH) refere: «Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns com os outros em espírito de fraternidade.» (ONU-ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 1948: Artº 1º).
A citação que antecede, poderia parecer desajustada ou até contraditória, na medida em que os valores consagrados no Artº 1º da DUDH, parece não corresponderem à realidade do mundo do século XXI, mais se afigurando provisórios, porém, qualquer conclusão terá, necessariamente, de, e por enquanto, manter sérias reservas, porque, infelizmente, ainda se verificam, à escala mundial, diários e permanentes atropelos aos Direitos Humanos, o que, em plena era das mais profundas revoluções, com implicações diretas na vida de todos os cidadãos, não se devem aceitar as permanentes violações. Só em raríssimas e excepcionais circunstâncias se poderá tentar compreender o incumprimento de alguns Direitos.
Se é verdade que os Direitos Humanos, fundados nos Direitos Subjectivo/ Natural e Positivo/Legalista, são legais, porque legítimos, não é menos verdade que o seu cumprimento ecuménico carece de eficácia, e para que esta se verifique torna-se indispensável a aplicação de regras sancionatórias coercivas para todos os que os violam, como, finalmente, parece que está a acontecer em relação aos alegados culpados do genocídio da segunda guerra mundial.
Mas será que o uso da força resolve a atual situação de permanente violação dos Direitos Humanos? Bastará um conjunto de regras e de sanções para que todos respeitem os Direitos Humanos? Que outros meios, provavelmente menos eficazes, ainda que de mais demorada implementação, e com resultados a longo prazo, se poderiam utilizar?
Entre outros meios disponíveis, devo salientar a educação e a religião, cujas características específicas, vocacionadas para a formação cívica e moral do homem respetivamente, podem contribuir, de forma decisiva, para que daqui a algumas décadas a paz no mundo seja possível, se todos compreenderem e respeitarem os direitos de cada um, a começar pelo próprio indivíduo perante si.
Nesta perspectiva, quero refletir um pouco, porque os tempos atuais são diferentes e, certamente, no futuro, outros valores preocupar-nos-ão, o que não implica termos que estar contra as conquistas da modernidade, ou seja, contra a liberdade, a igualdade e a fraternidade, contra a democracia e os Direitos Humanos, por isso, dizia há pouco, que a educação e a religião nos podem ajudar decisivamente, aliás, hoje em dia, um sistema religioso, com linhas de orientação em relação à realidade e uma visão científica do mundo, não se excluem obrigatoriamente, tal como a fé religiosa não exclui o empenhamento político.
Passaram-se mais de dois séculos sobre a Revolução Francesa; comemora-se em 2016 o sexagésimo oitavão aniversário da aprovação da Declaração Universal dos Direitos do Homem e, parece certo, a maior parte dos Estados, como também a maior parte das Igrejas, defendem valores e princípios fundamentais, concretamente: a inviolabilidade da pessoa humana; a liberdade inalianável do ser humano; o princípio da igualdade de todos os seres humanos; a necessidade de solidariedade entre todos os homens, entre outros.
Então, parece-me perfeitamente plausível defendermos tais princípios e valores, como acrescentarmos outro tipo de preocupações essenciais; para este terceiro milénio, tais como:
a) «Não só de liberdade, mas também de igualdade e de justiça, que conduzam a uma sociedade em que os seres humanos possuam igualdade de direitos, vivam coletivamente numa atmosfera de solidariedade, longe de diferenças que separam ricos e pobres, poderosos e oprimidos, da fome, do desemprego da violação dos Direitos Humanos;
b) Não só igualdade, mas também pluralidade, através de uma via que conduza a uma multiplicidade reconciliada de culturas, tradições e povos do mundo, longe das divisões segregadoras, do desrespeito e da marginalização;
c) Não só da fraternidade, mas também da irmandade entre homens e mulheres, longe das separações entre esses mesmos homens e mulheres na sociedade, da rigidez de papéis, ideologicamente fixados, da recusa do reconhecimento das aptidões concedidas às mulheres para a vida. Uma nova ordem assente no companheirismo;
d) Não só de coexistência, mas também de paz, encontrando um novo caminho que conduza a sociedade para a solução pacífica dos conflitos, para uma comunidade de povos, longe dos juízos e das ideologias, da idolatrização, da intervenção dos militares para imposição dos Direitos Humanos. Precisamos de uma ordem mundial que reivindique a paz;
e) Não só produtividade, mas também solidariedade em relação ao meio ambiente, descobrindo o caminho que conduza a uma comunidade de todos os seres humanos, em harmonia com todas as criaturas, longe da separação dos seres humanos e da restante criação, e um estilo de vida emergente de formas de produção que lesam a natureza, de um individualismo que viola a integridade da criação, enfim, precisamos de uma ordem mundial ecológica;
f) Não só tolerâmcia, mas também ecumenismo, investigando sobre as possobilidades de encontrar um meio, construir uma comunidade humana consciente de que necessita de absolvição e regeneração constantes, longe das diversas clivagens, ainda, hoje, de desconfiança. Carecemos de uma ordem mundial ecuménica;
g) Finalmente, não só ecumenismo, mas também uma consciência das nossas responsabilidades globais, relativamente ao futuro da humanidade. Para que tal aconteça deveremos distanciarmo-nos de toda e qualquer atitude de abstinência em matéria de ética e, pelo contrário, exigirmos, lutarmos por um “Ethos global”, no seu significado grego de: carácter, propósito moral; também no seu sentido sociológico atual: o de uma ordem normativa interiorizada, um conjunto de princípios morais que regulam a vida.» (Autor Desconhecido).
Tenho defendido que caberá um papel importante, mesmo imprescindível, à filosofia contemporânea, (apesar das sucessivas tentativas de esvaziamento que vão surgindo, não só pelos avanços da ciência, da técnica e da tecnologia como, lamentavelmente, por alguns dos seus mais radicais detratores), no sentido de defender e incutir nas pessoas um novo conceito da pessoa humana, enquanto detentora de Direitos e Deveres, ou seja, dotando-as de cidadania plena.
Com efeito, poderiamos concluir interpretando HABERMAS no que concerne às três categorias de Direitos que ele distingue, ou seja: “ a) Direito de liberdades iguais subjectivas de acção; b) Direito de um status para a comunidade jurídica; c) Direito de protecção dos direitos individuais.” (cf. 1998)
Quaisquer que sejam as estruturas que fundamentam um corpo jurídico de Direitos e Deveres, não haverá duvidas que, direta ou indiretamente, explicita ou implicitamente, elas integrarão os princípios e valores que consagram os direitos humanos, sendo certo que numa democracia do tipo ocidental, nos verdadeiros Estados de Direito Democrático, é impensável qualquer ausência e/ou referência forte aos Direitos Humanos.