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Mathildenhöhe, em Darmstadt, é um bairro muito interessante. No juízo que sobre ele faço, assente em critérios de vária sorte, têm primazia uma colorida igreja ortodoxa russa e alguns edifícios Jugendstil (equivalente alemão da Arte Nova) do primeiro decénio do século xx, a saber, a torre dos Matrimónios, a casa Ernesto Luís e a grande moradia de Glückert.
A igreja, do fim do século xɪx, fruto de laços entre a família Romanov e a casa reinante no Hesse, tem três cúpulas douradas em forma de bolbo, cada uma com cruz em remate. Não é bonita, mas chama a vista por ser louçã, pelo sortilégio da cor.
A torre dos Matrimónios, peculiar construção de tijolo, tem espaços para enlaces e exposições, é o principal íman turístico da terra. Incrustado numa parede do seu vestíbulo, o conjunto de mosaicos O beijo, de Friedrich Wilhelm Kleukens, mostra, deitados de ventre para baixo, um homem e uma mulher que se beijam e abraçam; os corpos nus e as asas que deles saem compõem quadro que evoca um ómega. Horários de abertura e acasos do amor transformaram a torre em apeadeiro inicial de férias que — assim o havia prometido à Jūratė — seriam românticas.
As duas casas que mencionei foram concebidas pelo arquiteto Joseph Maria Olbrich, que se instalou em Darmstadt na sequência da criação, pelo grão‑duque Ernesto Luís, de uma colónia de artistas e de arquitetos em Mathildenhöhe. No exterior da primeira avultam, antepostas ao portal enfeitado com um arranjo de flores laranja, branco e auricolor, as imponentes estátuas de um homem e de uma mulher, trabalhos de Ludwig Habich; o imóvel alberga o museu da colónia de artistas, que, graças à exposição de mobiliário, escultura, joalharia e objetos de uso quotidiano, permite compreender a aplicação da ideia de «obra de arte total» (Gesamtkunstwerk). Porquanto não entrámos na vivenda de Julius Glückert, não conhecemos o rico adorno dos respetivos aposentos; ainda assim, o mirone que sou satisfez−se com o aparato externo (relevos nas paredes, porta grande carregada de Jugendstil, portal que faz lembrar um ómega, flores rechonchudas do portão metálico).
Depois do passeio por Mathildenhöhe e de um almoço tardio, fomos a Waldspirale, complexo residencial de mil cores, traço irregular e cúpulas que sugerem cebolas. Não há nele duas janelas iguais. Gostei, mas, adepto do minimalismo e da arquitetura depuradora, seria incapaz de ali viver. O meu sono e os meus sonhos precisam de fundo de uma só cor.
Seguiu‑se giravolta pelo centro e suas adjacências, com mais um mergulho nas sinuosidades do Jugendstil, agora no complexo de banho e lazer Jugendstilbad.
Ao cruzar um jardim, vimos miosótis, flor a que se chama «não‑me‑esqueças», e Darmstadt é realmente digna de boa lembrança. Quando lá chegámos, trazia o peso do cansaço, de meses de labuta. Mas o estalo do chicote que criou as curvas caraterísticas do Jugendstil despertou‑me a mim também. É certo que em Bruxelas há Arte Nova. Contudo, foi em Darmstadt que, por mor de cura geográfica, furei o casulo da fadiga e remocei. No que toca à Jūratė, ainda lhe disse que amá‑la é sempre uma arte nova.