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Escrevendo aqui há tempos para um outro periódico sobre utilização e eliminação de agrotóxicos, fui conduzida a uma pesquisa sobre o uso dos mesmos, tendo descoberto que (e transcrevo): em 2017 realizou-se em Lisboa um encontro internacional de “Alternativas aos herbicidas”, com um elevadíssimo grau de participação, juntando freguesias e municípios e ainda o presidente da Câmara da cidade belga Gent, que realçou «as motivações para o abandono dos pesticidas, o processo de transição e os resultados alcançados. Algumas plantas espontâneas foram permitidas, a cidade tornou-se mais verde, mais florida, com mais aves, a reação dos residentes foi muito positiva, os jardineiros aprenderam muito sobre plantas e passou a ter apicultores. Gent tornou-se uma cidade aprazível para todos!»
É uma experiência inspiradora, mas não é por aqui, pelo uso ou abandono dos pesticidas, que quero hoje seguir. Dá-se o caso de ter encontrado entre os livros da Biblioteca do filósofo António Telmo, um exemplar intitulado A Vida das Abelhas, de Maurice Polydore Marie Bernard Maeterlinck, mais conhecido pelo seu último apelido, nascido em Agosto de 1862 em… Gent (Ghent ou Gante, vejo várias versões…). O seu livro, que tenho estado a ler na tradução exemplar de Cândido de Figueiredo, não é um manual técnico sobre as abelhas, mas um texto de divulgação, quase poético, sobre estas loiras avícolas, nas palavras de Ronsard.
O livro é uma maravilha, a tradução um mimo, mas a razão por que trago aqui o tema é esta curiosa ligação entre a experiência da cidade belga de Gent testemunhada em Lisboa em 2017, no seu acréscimo da qualidade de vida reflectida em factores vários, nomeadamente o aparecimento de apicultura, e este belga, dramaturgo, poeta, ensaísta, galardoado com o Nobel da Literatura em 1911, autor de um dos mais emocionantes textos poético-realistas sobre as abelhas, com primeira edição em 1901. Mas esta privilegiada relação entre a Bélgica e a vida das abelhas não se fica por aqui, pois fiquei a saber, por Maeterlinck na tradução portuguesa, que o naturalista flamengo Clutins foi quem, entre outras descobertas importantes, deu a conhecer que «a rainha é a única mãi de todo o seu povo, e possue os atributos dos dois sexos».
Da leitura do livro fica-se a saber quão misteriosa é a vida das abelhas, e da observação das coincidências se conclui como é misteriosa a nossa vida. Muito para além de toda a capacidade de interpretação.
Fica o registo sobre este autor nascido em Ghent, apaixonado pelas abelhas, e a experiência, tantos anos depois, da despoluição de herbicidas levada a cabo nesta mesma cidade, com o consequente desenvolvimento da apicultura. Sob o olhar benévolo que não conseguimos ver, mas imaginamos, de Maeterlinck. Há quem parta deixando o mundo mais rico.