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Honrar o nome das pessoas que nunca souberam escrever nem ler.
Mas elas não foram esquecidas e nunca serão por mim, porque foram os meus mestres da vida.
Ainda hoje penso na inteligência de muitas pessoas das Aldeias que não sabiam escrever nem ler, pois tinham que trabalhar desde bem pequeninas.
Mas sabiam pesar os alimentos do campo nas balanças e fazer contas, como se dizia no passado, contas de cabeça. Grande capacidade tinham eles.
Vi várias vezes uma senhora que não sabia escrever nem ler mas tinha uma taberna. Numa folha branca ela fazia uns riscos que equivale ao peso dos produtos que vendia. Sabia registar no papel o peso dos produtos por correspondência aos pesos da balança.
Naquela época eu era uma criança e ficava a apreciar aquela actividade. Por vezes ela dizia-me: agora fazes tu as contas. Eu dava conta do recado.
Pois digo que ela fazia as contas certas e eu, criança que era, tinha que contar pelos dedos das mãos. Tenho pena de não ter aprendido a fazer as contas como ela fazia. Hoje em dia, aqueles riscos que ela fazia num papel seriam reconhecidos como um sinal de grande inteligência das pessoas que não sabiam escrever nem ler. Todos tinham a sua maneira de fazer as coisas, como olhar para o céu e saberem prever o estado do tempo para o dia seguinte. Olhavam para a lua e para as estrelas e sabiam as datas mais acertadas para semear ou plantar.
As obras que eles faziam, que inteligência. Hoje vejo tanta coisa que se deixa estragar. Mas não devia ser assim. Deviam salvar as obras que ele fizeram com tanta sabedoria.
Naquele tempo as crianças aprendiam com os pais e com os avós e era assim que se faziam as coisas e que se passava o conhecimento.
A minha mãe nunca teve a possibilidade de aprender a escrever nem ler. O meu avô morreu com a idade de 34 anos Ela teve que ir trabalhar. Não aprendeu a escrever mas tem uma inteligência rara e faz mais rápido uma conta com resultado certo, que eu pelo meu telemóvel. Mas entre nós as duas, quando fazemos uma competição, eu vou fazer uma conta num papel, como se fazia quando eu andava na escola primária, mas ela termina primeiro que eu e começa a rir. Pergunta-me: quanto deu a tua conta? Eu respondo-lhe com um grande sorriso: está certa.
Tantas vezes lhe digo: você diz que não sabe, mas termina o cálculo primeiro que eu. Às vezes até choramos de tanto rir. Digo-lhe que nunca mais quero ouvir que sou uma burra. Digo sim: mas que inteligência têm as burras como você. Aí sim, damos muitas gargalhadas.
Por vezes preciso de me deslocar nos transportes públicos. É raro eu saber qual o transporte mais adequado, mas ela conhece os destinos de cada linha de transporte.
Diz que as pessoas só andam de carro mas não sabem apanhar um autocarro nem para onde vai.
Não faz muitas semanas, que alguém na rua me perguntou para onde ia aquele autocarro. Estava com a minha mãe e eu disse-lhe: mãe, você pode responder, porque eu não sei.
Depois olhou para mim e perguntou-me: quantas vezes já te perguntaram para onde vai o autocarro? Respondi que muitas vezes me perguntaram.
E será que deste a indicação certa? Será que enviaste as pessoas para os autocarros certos?
Dei uma gargalhada e respondi que certamente já teria enganado uma ou outra pessoa.
Esse autocarro que você acabou de indicar àquela pessoa, respondi-lhe que só passava no aeroporto. Ela retrucou: Nada mau. Mandas as pessoas viajar para outros países. Mando apanhar o autocarro que vai para o aeroporto, pois queres que todos apanhem um avião. Desatamos à gargalhada. Acho que fazia muito tempo que não sorriamos assim.
Chegou a minha irmã e a nossa mãe referiu o número de um autocarro. Depois perguntou: Sabes para onde vai? Sei lá eu para onde vai, respondeu a minha irmã .
Aprendi muito com as pessoas que nunca souberam escrever nem ler.
Rosa Pereira 30.04.2022 (GE)