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A hora do calor devia ser património imaterial da UNESCO. Já é património oficioso de Portugal e dos demais países quentes. É um tempo que passa despercebido, entre o passar dos dias e o tiquetaquear dos relógios - ninguém dá por ele. Mas na verdade, é uma ode à liberdade. É o tempo pelo qual desesperamos o ano todo.
Engane-se quem pensa que é na azáfama dos dias de praia, almoçaradas e jantaradas que está a magia do Verão. A magia da estação está na hora em que “não se pode fazer nada com este calor”. É neste tempo perdido no vácuo do contínuo que é a “semana de férias” que está o valor das mesmas.
Nunca no nosso dia-a–dia temos um tempo em que é suposto não se fazer nada. É um tempo absolutamente sagrado: é quando temos a permissão para não fazer nada que se faz tudo. Conversamos horas a fio com quem devíamos conversar horas a fio, lemos o que nos apetece sem intervalo de tempo definido, escrevemos, jogamos às cartas, vemos um filme, dormimos a sesta, enfim - fazemos coisa nenhuma!
Tudo o que há para fazer pode ser feito “pela fresca”. Temos essa autorização, dada pela autoridade suprema do clima quente. Ninguém deixa de respeitar essa autoridade e que quem o faça seja severamente punido. Para mim, quem tenta esgueirar produtividade planeada na hora calor está a cometer um crime de lesa-pátria.
Tenho a certeza que foi na hora do calor que o Infante Dom Henrique pensou os Descobrimentos, que Luís de Camões foi visitado pelas Musas e que Fernando Pessoa idealizou “Mensagem”. A Hora do Calor é tão portuguesa como o Fado ou o Galo de Barcelos e devemos preservá-la como a relíquia que é.